Portugal Iniciático - Mosteiro da Batalha [Mosteiro de Santa Maria da Vitória]

14 de junho de 2011 ·


Dedicado à minha amiga Astrid Annabelle,
em viagem iniciática por Portugal

Como muitos sabem, há um país chamado Portugal que os nossos olhos de terceira dimensão podem ver e apreciar. Há determinados espaços, edificados ou não, que correspondem a um Portugal iniciático, muito pouco visível aos nossos olhos tridimensionais. Um dos exemplos é o Mosteiro da Batalha, de seu nome completo: Mosteiro de santa Maria da Vitória. Esta edificação foi classificada pela UNESCO como «Património Mundial».



Foi mandado edificar por D.João I de Portugal como agradecimento à Virgem Maria pela vitória na Batalha de Aljubarrota. Este mosteiro dominicano foi construído ao longo de dois séculos, desde o início em 1386 até cerca de 1517, e ao longo do reinado de sete reis de Portugal, embora desde 1388 já ali vivessem os primeiros dominicanos. Exemplo da arquitectura gótica tardia portuguesa, ou estilo manuelino, é considerado património mundial pela UNESCO, e em 7 de Julho de 2007 foi eleito como uma das sete maravilhas de Portugal. Em Portugal, o IPPAR ainda classifica-o como «Monumento Nacional», desde 1910.



No arranque das obras do Mosteiro da Batalha foi construído um pequeno templo, cujos vestígios eram ainda visíveis no princípio do século XIX. Era nesta edificação ― Santa Maria-a-Velha, também conhecida por Igreja Velha ― que se celebrava missa, dando apoio aos operários do estaleiro. Tratava-se de uma obra pobre, feita com escassos recursos.

Em traços esquemáticos conhece-se a evolução do estaleiro propriamente dito e o grau de avanço das obras. Sabe-se que ao projecto inicial corresponde à igreja, o claustro e as dependências monásticas inerentes, como a Sala do Capítulo, sacristia, refeitório e anexos. É um modelo que se assemelha ao adoptado, em termos de orgânica interna, pelo grande mosteiro alcobacense.

A capela do Fundador, capela funerária, foi acrescentada a este projecto inicial pelo próprio rei D. João I, o mesmo acontecendo com a rotunda funerária conhecida por Capelas Imperfeitas, da iniciativa do rei D. Duarte.

O claustro menor e dependências adjacentes, ficaria a dever-se à iniciativa de D. Afonso V, sendo de notar o desinteresse de D. João II pela edificação. Voltaria a receber os favores reais com D. Manuel, mas somente até 1516-1517, ou seja, ate à sua decisão em favorecer decididamente a fábrica do Mosteiro dos Jerónimos.



Muitos dos que hoje vivemos em Portugal e Brasil, estamos intimamente ligados a esta edificação por, em vidas passadas, termos cá estado, quer na vida monástica, quer no grupo de operários que construiu a edificação. Foram quase 200 anos de construção e milhares de pessoas aqui estiveram em trabalho. É das construções iniciáticas, aquela que tem uma localização especial no território português.


Mais informações, aqui.




O Panteão de D. Duarte, também conhecido por Capelas Imperfeitas, foi planeado tendo em conta uma leitura rigorosa do testamento de D. João I, optando aquele monarca por criar o seu próprio espaço funerário. Assim, D. Duarte deu início à edificação de uma rotunda atrás da cabeceira. De qualquer modo, as obras, também conduzidas por Huguet, não foram terminadas, uma vez que a sua edificação terá começado sensivelmente em 1434, tendo o monarca falecido quatro anos depois, deixando-as incompletas. Mas o traçado estava certamente delineado e as obras dos reinados seguintes foram lentamente tentando rematar o edifício, tendo porém ficado por fazer o principal: o lançamento da grande abóbada central. Ao contrário do que se possa julgar, esta operação não levantaria grandes problemas técnicos visto que o vão a cobrir pouco maior era do que o existente na Sala do Capítulo.

Tratava-se, efectivamente, de um edifício com um corpo central octogonal e entrada a eixo (articulada com a cabeceira por um átrio abobadado), à volta do qual se dispunham sete capelas radiantes. Nascendo dos grandes maciços polistilos que conformam a estrutura, levantar-se-ia um corpo octogonal provido de grandes janelões, abobadado e devidamente escorado em arcobotantes, previsto para configurar um amplo espaço de planta centrada completamente unificado. As capelas existentes abrem-se para o recinto através de grandes arcos quebrados acairelados, possuindo cada uma delas um coro recto e um topo prismático de três faces, com um só janelão de dois lumes em cada face e cobertura de abóbada nervurada. Entre as capelas, servindo de reforço, abrem-se seis pequenas áreas de planta triangular, sem acesso, mais baixas que as capelas e decoradas exteriormente com um janelão.

Nas capelas foi dado um acabamento posterior e mais cuidado à que se destinava a receber o mausoléu de D. João II e D. Leonor, tendo as obras sido patrocinadas pela rainha. A data desta intervenção é difícil de determinar, podendo ser bastante tardia. De qualquer modo, a decoração deste trecho atinge proporções verdadeiramente assombrosas, sendo um exemplo único no gótico português. As nervuras são acaireladas, com nervos secundários de função apenas escultórica, mas com pequenas chaves em cúspide invertida, decoradas com motivos vegetalistas trepanados, sendo as chaves maiores rendilhadas, apresentando, por sua vez, as armas reais e o «corpo de empresa» de D. João II (o pelicano) e da Rainha D. Leonor (o camaroeiro).


Estas ilustrações foram enviadas pela minha querida amiga e conterrânea,

Muito obrigado, G.




.

5 comentários:

Especialmente Gaspas disse...
14 de junho de 2011 às 10:30  

Lindissimo!!!!!!!! Pormenores fantásticos. Por muito que se olhe e se absorva há sempre um detalhe que nos escapa!

Astrid Annabelle disse...
14 de junho de 2011 às 10:49  

Espetacular António querido!
Estive por lá logo após ter estado no Santuário de Fátima! Foram duas emoções fortes seguidas...pena que estava fechado na hora em que lá estivemos. Mesmo assim fiquei muito impressionada e tiramos muitas fotos.
Agradeço mais uma vez o carinho em me dedicar este post e esta série toda de maravilhas históricas portuguesas...o coração faz tum...tum...
Beijão
Astrid Annabelle

William Garibaldi disse...
14 de junho de 2011 às 14:31  

Sublime meu amigo!
Arquitetura dos Anjos!

Quanta beleza há em teu coração, "bem hajas!"

Abraço

William.

Táxi Pluvioso disse...
15 de junho de 2011 às 09:47  

Pode ser que os nossos credores fiquem com ele (por tuta e meia, claro, como agora vão começar os saldos em Portugal). boa semana

blog do ale''italia disse...
30 de setembro de 2012 às 23:55  

Belíssimo essse Mosteiro.Quanta historia!!!Emocionante!!! Visitei-o em setembro desse ano

14 de junho de 2011

Portugal Iniciático - Mosteiro da Batalha [Mosteiro de Santa Maria da Vitória]


Dedicado à minha amiga Astrid Annabelle,
em viagem iniciática por Portugal

Como muitos sabem, há um país chamado Portugal que os nossos olhos de terceira dimensão podem ver e apreciar. Há determinados espaços, edificados ou não, que correspondem a um Portugal iniciático, muito pouco visível aos nossos olhos tridimensionais. Um dos exemplos é o Mosteiro da Batalha, de seu nome completo: Mosteiro de santa Maria da Vitória. Esta edificação foi classificada pela UNESCO como «Património Mundial».



Foi mandado edificar por D.João I de Portugal como agradecimento à Virgem Maria pela vitória na Batalha de Aljubarrota. Este mosteiro dominicano foi construído ao longo de dois séculos, desde o início em 1386 até cerca de 1517, e ao longo do reinado de sete reis de Portugal, embora desde 1388 já ali vivessem os primeiros dominicanos. Exemplo da arquitectura gótica tardia portuguesa, ou estilo manuelino, é considerado património mundial pela UNESCO, e em 7 de Julho de 2007 foi eleito como uma das sete maravilhas de Portugal. Em Portugal, o IPPAR ainda classifica-o como «Monumento Nacional», desde 1910.



No arranque das obras do Mosteiro da Batalha foi construído um pequeno templo, cujos vestígios eram ainda visíveis no princípio do século XIX. Era nesta edificação ― Santa Maria-a-Velha, também conhecida por Igreja Velha ― que se celebrava missa, dando apoio aos operários do estaleiro. Tratava-se de uma obra pobre, feita com escassos recursos.

Em traços esquemáticos conhece-se a evolução do estaleiro propriamente dito e o grau de avanço das obras. Sabe-se que ao projecto inicial corresponde à igreja, o claustro e as dependências monásticas inerentes, como a Sala do Capítulo, sacristia, refeitório e anexos. É um modelo que se assemelha ao adoptado, em termos de orgânica interna, pelo grande mosteiro alcobacense.

A capela do Fundador, capela funerária, foi acrescentada a este projecto inicial pelo próprio rei D. João I, o mesmo acontecendo com a rotunda funerária conhecida por Capelas Imperfeitas, da iniciativa do rei D. Duarte.

O claustro menor e dependências adjacentes, ficaria a dever-se à iniciativa de D. Afonso V, sendo de notar o desinteresse de D. João II pela edificação. Voltaria a receber os favores reais com D. Manuel, mas somente até 1516-1517, ou seja, ate à sua decisão em favorecer decididamente a fábrica do Mosteiro dos Jerónimos.



Muitos dos que hoje vivemos em Portugal e Brasil, estamos intimamente ligados a esta edificação por, em vidas passadas, termos cá estado, quer na vida monástica, quer no grupo de operários que construiu a edificação. Foram quase 200 anos de construção e milhares de pessoas aqui estiveram em trabalho. É das construções iniciáticas, aquela que tem uma localização especial no território português.


Mais informações, aqui.




O Panteão de D. Duarte, também conhecido por Capelas Imperfeitas, foi planeado tendo em conta uma leitura rigorosa do testamento de D. João I, optando aquele monarca por criar o seu próprio espaço funerário. Assim, D. Duarte deu início à edificação de uma rotunda atrás da cabeceira. De qualquer modo, as obras, também conduzidas por Huguet, não foram terminadas, uma vez que a sua edificação terá começado sensivelmente em 1434, tendo o monarca falecido quatro anos depois, deixando-as incompletas. Mas o traçado estava certamente delineado e as obras dos reinados seguintes foram lentamente tentando rematar o edifício, tendo porém ficado por fazer o principal: o lançamento da grande abóbada central. Ao contrário do que se possa julgar, esta operação não levantaria grandes problemas técnicos visto que o vão a cobrir pouco maior era do que o existente na Sala do Capítulo.

Tratava-se, efectivamente, de um edifício com um corpo central octogonal e entrada a eixo (articulada com a cabeceira por um átrio abobadado), à volta do qual se dispunham sete capelas radiantes. Nascendo dos grandes maciços polistilos que conformam a estrutura, levantar-se-ia um corpo octogonal provido de grandes janelões, abobadado e devidamente escorado em arcobotantes, previsto para configurar um amplo espaço de planta centrada completamente unificado. As capelas existentes abrem-se para o recinto através de grandes arcos quebrados acairelados, possuindo cada uma delas um coro recto e um topo prismático de três faces, com um só janelão de dois lumes em cada face e cobertura de abóbada nervurada. Entre as capelas, servindo de reforço, abrem-se seis pequenas áreas de planta triangular, sem acesso, mais baixas que as capelas e decoradas exteriormente com um janelão.

Nas capelas foi dado um acabamento posterior e mais cuidado à que se destinava a receber o mausoléu de D. João II e D. Leonor, tendo as obras sido patrocinadas pela rainha. A data desta intervenção é difícil de determinar, podendo ser bastante tardia. De qualquer modo, a decoração deste trecho atinge proporções verdadeiramente assombrosas, sendo um exemplo único no gótico português. As nervuras são acaireladas, com nervos secundários de função apenas escultórica, mas com pequenas chaves em cúspide invertida, decoradas com motivos vegetalistas trepanados, sendo as chaves maiores rendilhadas, apresentando, por sua vez, as armas reais e o «corpo de empresa» de D. João II (o pelicano) e da Rainha D. Leonor (o camaroeiro).


Estas ilustrações foram enviadas pela minha querida amiga e conterrânea,

Muito obrigado, G.




.

5 comentários:

Especialmente Gaspas disse...

Lindissimo!!!!!!!! Pormenores fantásticos. Por muito que se olhe e se absorva há sempre um detalhe que nos escapa!

Astrid Annabelle disse...

Espetacular António querido!
Estive por lá logo após ter estado no Santuário de Fátima! Foram duas emoções fortes seguidas...pena que estava fechado na hora em que lá estivemos. Mesmo assim fiquei muito impressionada e tiramos muitas fotos.
Agradeço mais uma vez o carinho em me dedicar este post e esta série toda de maravilhas históricas portuguesas...o coração faz tum...tum...
Beijão
Astrid Annabelle

William Garibaldi disse...

Sublime meu amigo!
Arquitetura dos Anjos!

Quanta beleza há em teu coração, "bem hajas!"

Abraço

William.

Táxi Pluvioso disse...

Pode ser que os nossos credores fiquem com ele (por tuta e meia, claro, como agora vão começar os saldos em Portugal). boa semana

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